O RETORNO DO RUGIDO (E O RISCO DE EM BREVE NOVAMENTE SE SILENCIAR)

O RETORNO DO RUGIDO (E O RISCO DE EM BREVE NOVAMENTE SE SILENCIAR)

- Autoria do escritor Ricardo Reys (18/06/2015).
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O RETORNO DO RUGIDO (E O RISCO DE EM BREVE NOVAMENTE SE SILENCIAR)

2015 marca a volta de uma das franquias mais lucrativas de Hollywood. Sucesso absoluto de público, a marca Jurassic Park novamente tomou as telas, captando o fascínio de crianças e adultos. 

Porém, dada a (pouca)qualidade desse novo filme, é de se supor que tempos turbulentos novamente retornem à Ilha Nublar. A renovação apresentada não será suficiente a longo prazo. Tampouco, o encanto e a emoção despertados se devem muito mais aos dinossauros em si do que à obra. Aqui, a franquia teve a chance de recomeçar sua história, porém, caiu nos mesmos erros que outrora cometeu. E novamente pagará o pato, ou melhor, o Dino bico-de-pato por isso.

Reprodução: Universal Pictures
Serei sincero. Um dos assuntos que mais me interessam são Dinossauros. Sempre soube nomes e espécies, bem como comportamentos e hábitos. Caçava (e ainda caço) reportagens e artigos com a mesma voracidade de um Tyrannosaurus Rex. Porém, dado a condições que a vida levou, me formei em publicidade, cursando agora administração, com a mesma capacidade de se adaptar de um Homus Trabalhadorus. É, aqui não é o Cretáceo... Da mesma forma, sei que compartilho do interesse de milhões de pessoas. Daquelas que conseguem encher em 1,6 bilhão o faturamento, fazendo de Jurassic World, uma das maiores bilheterias da história e, pasmem, a maior bilheteria em estreia de todos os tempos. Não é pouco. E isso se deve, principalmente, ao tema de fundo.

Tudo nos dinossauros é fascinante. Hábitos, tamanhos, capacidade de sobrevivência, garras e dentes, chifres e ornamentações, velocidade, voracidade, inteligência... Historicamente, são o organismo multicelular complexo mais bem sucedido de todos os tempos, que a mais tempo estão no nosso meio e que hoje mantém o status de classe imensamente variada e tremendamente sucedida do reino animal - afinal, viraram as aves. Porém, o seu objeto de fascínio vem de uma característica pouco explorada, no entanto, extremamente necessária para o seu sucesso comercial; a subjetividade. A psique humana nos faz se interessar mais por aquilo que não podemos ver e tocar. O subjetivo nos permite interpretar como nenhuma outra espécie pode, e, por mais que dinossauros sejam constantemente representados por meios de comunicação impressos ou audiovisuais, cabe a nós imaginarmos a sua presença com base nisso. Em outras palavras, parte da graça dos dinossauros é que eles não mais existem. Dito isso, é explicado o porquê do sucesso de tudo que os envolve - desde que minimamente feito com competência.

Competência foi o que faltou em alguns momentos da franquia. Em 2001, foi lançado Jurassic Park 3 nos cinemas. A expectativa fora alta, ainda mais depois da decepção de O Mundo Perdido, segundo filme da série. Material promocional foi amplamente divulgado, teasers e trailers vinham a rodo. Porém, o que antes era empolgação se configurou naquele que é, sem dúvidas, o pior filme da franquia - e um dos piores do gênero de aventura. Roteiro pobre, aliado a personagens idem e dinossauros pouco ameaçadores, fizeram desse filme um estrago imensurável na série, capaz de adiar esse atual Jurassic World que a princípio seria lançado em 2005, para somente agora, dez anos depois. Nesse meio tempo, revisões de script se sucederam, notícias se tornaram frequentes. Logo, ficou claro que o público se cansou da velha jornada à ilha. Era necessário diferenciação. Então, em 2008, o diretor Joe Johnston deixou vazar que o roteiro de JP4 seria extremamente diferente das suas prequências. Nele, não veríamos os animais em sua forma convencional, mas sim, a genética em seu avanço máximo, usada para criar dinossoldados por assim dizer, usado em guerras e numa realidade um tanto quanto distante da ilha Nublar. O resultado? Não tardou para Spielberg chamar o argumento de porcaria e afastar Johnston e o roteirista John Sayles do projeto.

No entanto, a premissa de brincar com genética é fascinante para se levar a franquia a outro patamar e relançá-la. E foi essa a aposta da série: no roteiro, o parque está em pleno funcionamento já há 10 anos. 20.000 visitantes são recebidos por dia. Porém, uma queda de público começa a incomodar os acionistas, exigindo assim alguma atitude. E ela vem com o Indominus Rex. Um híbrido de Tyrannossaurus Rex com outras espécies - dinossauros e contemporâneas. O resultado, como era previsto, dá errado. O bicho foge e o estrago começa.

Num primeiro momento, o argumento funciona. Porém, se não faltou carinho de Rick Jaffa e Amanda Silver, a dupla de roteiristas responsável também pelo excelente Planeta dos Macacos - A Origem, faltou qualidade sobretudo no carisma dos personagens e no desenvolvimento da história. No primeiro tópico, o personagem Owen Grady realmente se salva. O ator Chris Pratt passa a empolgação para o público. Ele, no papel de um ex-militar hoje treinador de Velociraptores - o dino mais agressivo da franquia - é responsável pelas principais cenas do longa. Melhor só não é do que Ty Simpkins, no papel de Gray, o mais novo dos dois irmãos em visita ao parque. O garoto dá um show de interpretação e ofusca praticamente todo o elenco. Porém, Bryce Dallas Howard não convence. Após aparecer muito bem em A Vila, demonstra que careceu de bons papéis para manter o nível. E a relações públicas Claire Dearing definitivamente não é um bom papel. Caricata e artificial. Pior que ela somente Irrfan Khan no papel de Simon Masrani, o novo dono do parque. O ator até pode se esforçar, mas esbarra nos mesmos problemas da colega de cena. Um personagem que, embora seja original, é demasiado exagerado e pouco carismático. A segunda cena em que pilota um helicóptero é uma das mais fracas da franquia.

Como roteiro o filme funciona até a metade. Justamente até a cena supracitada. Depois, um destaque em demasia é dado a personagens secundários em prol da história, e essa acaba, não se perdendo, mas pendendo para a comédia. É mal feita a intercalação entre momentos tensos e leves. Ora forçados, ora gratuitos. A trilha sonora, marca registrada do primeiro filme, repetida de forma original no segundo, estragada no terceiro, acaba aqui também se tornando problemática, aparecendo nos momentos errados e dando um tom errado à cena. Nesse campo, era sabido que Michael Giacchino tentaria manter o estilo de John Williams, sobretudo na música tema. Porém, a obsessão de se fazer isso em todas as faixas acabou contaminando o produto final. Por falar em final, é o final do filme uma síntese de tudo isso; a falta de carisma e de credibilidade. Não confunda com realismo. Jurassic Park não tem obrigação em ser realista. Mas sim, em ser crível, com a ciência, com ele próprio e com o público. Assim terá solidez. Assim terá qualidade. E o final do longa foi tudo menos crível.

Os efeitos especiais merecem um parágrafo especial. Faltou textura nos dinos. O efeito da computação gráfica ainda está longe da qualidade dos animatrônicos (robôs utilizados no primeiro longa). Basta colocar uma cena do Jurassic Park original ao lado deste atual para se aferir tamanha discrepância. E igual também pode ser observado no oposto: mesmo quando em cg, a qualidade dos animais fica extremamente distante daqueles de 1993. Mesmo assim, dada a complacência de Hollywood com os altos custos envolvidos em animatrônicos, bem como as vantagens da resolução da computação gráfica em 3d, hd e imax, Jurassic World pode sim ser considerado um forte competidor ao Oscar de efeitos visuais de 2016. Como elogio, deve-se ressaltar a fluidez dos movimentos e expressões dos dinos. Isto sim, um evidente e grande trabalho, deixando-os mais naturais, animais... deixando-os vivos.

Em suma, Jurassic World - e seu público - podem não ligar muito para essa crítica. E com razão. Simplesmente porque qualidade não é o principal foco da obra. Funcionalidade é o principal foco da obra. Assim como em demais enlatados de Hollywood. Uma diversão para família, amigos e público em geral, traduzida na direção inexperiente de Colin Trevorrow (apenas seu segundo filme para o cinema), assim escolhido mais por ser fã ardoroso da franquia e por fazer exatamente o solicitado pela Universal Pictures e Spielberg. Mesmo assim, pouco pôde fazer sobre um roteiro feito na medida para agradar a todos, mesmo que pague sérios preços por isso.

E esses preços virão a longo prazo... Pois Jurassic World escolheu um caminho que embora garante sucesso agora, tenderá a exigir mais do mesmo depois. E numa análise fria, essa é uma fórmula pouco funcional, uma vez que foi de forma fraca - embora passionalmente - trabalhada neste atual filme. Onde os resultados de bilheteria vieram mais pela novidade e pelo tema do que pela qualidade. No próximo longa, embora produtores falem da necessidade de se mudar para não cometer os erros do passado, o mesmo ainda estará presente, uma vez que é esse o novo âmago da franquia.

Desse modo, é fácil constatar que teremos sim um Jurassic Park 5. Porém, com um seríssimo risco de não contarmos mais com um 6.

Ricardo Jardim Reys
18/06/2015